O CRISTÃO TEM QUE PENSAR

Você é daquelas pessoas que gostam de receber tudo pronto, mastigado sem precisar aplicar muito esforço? Você gosta de ter todas as respostas às suas duvidas e questionamentos de maneira rápida, sem perda de tempo? Gosta de comida congelada, entrega em domicílio, controle remoto, forno de microondas, café espresso e tudo o mais que seja rápido e resolvido com urgência? Gosta de ser paparicado e ter tudo ao alcance das mãos num piscar de olhos? Vê imagens e não se preocupa em saber o que está escrito nas letras miúdas?

Então esse blog não é para você!

Convidamos você a pensar, raciocinar, analisar, questionar e pôr o cérebro para funcionar. Queremos que você leia sem pressa, faça perguntas a si mesmo, saia da superfície e aventure-se nas profundezas.

Mastigue muitas vezes.
Não seja ansioso.
Venha desfrutar da boa comida, saudável.

Sirva-se à vontade!

segunda-feira, 30 de maio de 2011

E criou Deus o papagaio à sua imagem...


"E criou Deus o papagaio à sua imagem, à imagem de Deus o criou, macho e fêmea os criou", certo? Não, mas é o que parece, muitas vezes, em nossas igrejas. Talvez o papagaio não devesse ser usado como exemplo, pela quantidade de piadas a que ele remete, pois a idéia da mera repetição de palavras pela ave permite criar muitas situações engraçadas e esdrúxulas, inclusive várias piadas "sujas". Mas, mesmo com todos os palavrões e baixarias possíveis, muitas vezes a falta de raciocínio dos cristãos leva a situações tão ruins quanto essas - só que com consequências tristes - e que fariam corar até o maior fã do Ari Toledo. Duvida? Ligue a TV ou o rádio, ou compre alguns dos livros evangélicos mais vendidos...

Quando o texto bíblico (o verdadeiro, de Gênesis 1.27) diz que Deus criou o homem e a mulher à sua semelhança, indica que o homem possui, de alguma forma e em algum grau, atributos que Deus partilha conosco - os chamados atributos comunicáveis. Isso significa, por exemplo, que, se Deus é plenamente bom, o ser humano tem alguma medida de bondade.

Isso também ocorre com os chamados atributos mentais de Deus [1]. Ou seja, Deus tem todo o conhecimento (onisciência), sabedoria e veracidade e fez homens e mulheres com alguma capacidade de: conhecer a si mesmo, a Deus e ao mundo que os rodeia; escolher o melhor dentre várias opções possíveis e; buscar conhecer a verdade sobre os mais diversos assuntos. Mesmo após a Queda [2], algo disso ficou em nós.

Os textos bíblicos, por sua vez, são racionais e comunicados em uma linguagem estruturada. Percebem-se claramente as construções literárias de Jesus em suas parábolas, os argumentos de Paulo na Carta aos Romanos, a sequência lógica da Carta aos Hebreus... Se temos alguma capacidade mental e a Bíblia em nossas mãos, devemos nos esforçar para conhecer melhor o texto sagrado e fazer aplicações corretas dele. Deus nos criou com a capacidade de pensar e não utilizá-la é pecado, porque, pensando, ficamos mais parecidos com ele! Isso não invalida o "sobrenatural", ao contrário, o confirma, pois o próprio Deus prometeu conceder sabedoria a quem pedir [3], porém a sabedoria só é efetiva quando buscada [4].

Pensar sobre o que vemos e ouvimos, todavia, não é criar discussões inúteis sobre assuntos duvidosos - e a Bíblia tem assuntos difíceis [5] - mas protestar contra o que está evidentemente errado e pode trazer graves prejuízos, inclusive eternos. O que não devemos é ser meros papagaios, assistindo passivos à deturpação do Evangelho, repetindo, sem pensar, tudo o que nos falam. Senão, seremos joguetes nas mãos de pessoas inescrupulosas, como já foi previsto - e tem acontecido! - há quase 2.000 anos: "Entre vós haverá falsos mestres, os quais introduzirão encobertamente heresias destruidoras (...) E muitos seguirão as suas dissoluções, e por causa deles será blasfemado o caminho da verdade. (...) movidos pela ganância, e com palavras fingidas, eles farão de vós negócio..." [6].

Não é porque alguém falou do púlpito ou possui determinado título que está certo. Mas raciocinar também não significa carta branca para se rebelar contra qualquer liderança. O que devemos , isso sim, é submissão primária a Deus e à sua revelação através da Bíblia. Foi assim quando, numa época em que o perdão dos pecados era cobrado em dinheiro (as indulgências), Lutero publicou sua crítica - as famosas 95 Teses - convocando um debate sobre o assunto. Instado a meramente se retratar, recusou-se, "a menos que fosse convencido de seu erro pelo 'testemunho das Escrituras' ou pela razão" [7]. Essa é uma boa diretriz de pensamento.

Ninguém está livre de errar, mas com a discussão construtiva podemos chegar mais perto da verdade. E não devemos nos conformar com o erro, pois somos o sal da terra. E para que pode servir um sal que não salga? Absolutamente para nada, nem para adubo [8]! Que Deus nos ajude e ilumine... e nos livre do simples "Amém, Amém, Currupaco".




NOTAS
[1] Grudem, Wayne, Teologia Sistemática, Ed. Vida Nova, pp. 136-142.
[2] Veja Gênesis capítulo 3 e Romanos capítulo 5.
[3] Tiago, capítulo 1, versículos 5 a 7.
[4] Provérbios, capítulo 4, versículos 5 a 7 e capítulo 8, versículo 17.
[5] 2 Pedro, capítulo 3, versículos 15 e 16.
[6] 2 Pedro, capítulo 2, versículos de 1 a 3 (trechos).
[7] Cairns, Earle E., O Cristianismo através dos Séculos, Ed. Vida Nova, 2a. edição, p. 237.
[8] Lucas, capítulo 14, versículo 35.